terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Crítica cultural e sociedade







O título dessa postagem remete ao texto de Theodor Adorno - Crítica cultural e sociedade, escrito em 1949 - e evidencia que a relação literatura e sociedade não se trata, partindo da concepção do autor, de uma abordagem teórica que sustenta o entendimento maior sobre a cultura. Dessa forma, ao considerarmos a importância dessas reflexões, devemos ter leituras reflexivas como essa para além do seu entendimento, procurando estabelecer relações a partir das indagações provocadas.
Esta tarefa está calcada na interpretação de fragmentos do texto mencionado. São três citações que deverão ser comentadas com base na leitura dos textos discutidos em aula e também de outros textos que possam dialogar com as questões apresentadas.

1) "Mas a impropriedade da crítica cultural, no que diz respeito ao conteúdo, não decorre tanto da falta de respeito pelo que é criticado quanto do secreto reconhecimento, arrogante e cego, do objeto de sua crítica. O crítico da cultura mal consegue evitar a insinuação de que possui a cultura que diz faltar." (p. 07)

2) "A cumplicidade da crítica cultural com a cultura não reside na mera mentalidade do crítico. É ditada sobretudo pela relação do crítico com aquilo de que trata. Ao fazer da cultura seu objeto, o crítico torna a objetivá-la. O sentido próprio da cultura, entretanto, consiste na interrupção da objetivação." (p. 11)

3) "A função ideológica da crítica cultural atrela à ideologia sua própria verdade, a resistência contra a ideologia. A luta contra a mentira acaba beneficiando o mais puro terror." (p.16)

Literatura & Sociedade









KEUNEN, Bart & EECKHOUT, Bart. (ed.). Literature and Society. The function of Literary Sociology in Comparative Literature. Bruxelles; Bern; Berlin; Frankfurt/M.; New York; Oxford; Wien: Lang, 2001.


Introduction: The Rise and Fall of Literary Sociology... and Its Survival
Bart Keunen

Somente a partir dos anos 60 a academia reconheceu o tema “literatura e sociedade” como uma nova disciplina crítico-literária. Através de alguns precursores como Lukács e Adorno, outros teóricos inspirados pelo marxismo começaram a observar as nuances da complexa interelação dos textos literários com o seu contexto social. Foi somente no último terço do século XX que o campo começou a clamar por autonomia, assumindo nomes como: Sociologia da Literatura, Poética Sociológica ou Sociologia Literária. Talvez a melhor prova do desenvolvimento dessa subdisciplina da teoria literária foi o fato de no sexto congresso da International Caomparative Literature Association (1970) ter excepcionalmente aberto um amplo espaço para o tema da Littérature et Société. Conforme Robert Escarpit, organizador da conferência, o sucesso foi enorme, tanto que muitos submeteram abstracts que foram devolvidos. Ele chegou a conclusão de que o sucesso se deu em função de uma preocupação profunda dos comparatistas do mundo interiro com essa temática.
Nos anos 60 e 70, acadêmicos como Erich Köhler, Peter Bürger, Lucien Goldmann, Peter Zima e Terry Eagleton, mencionando apenas alguns, se convenceram que a crítica comparativista poderia ser organizada de acordo com o modelo sociológico. Um olhar nas livrarias acadêmicas daquele tempo nos ensinam que os estudantes estavam preocupados com as hipóteses sobre as relações ente literatura e ideologia, as condições sociais de expressão literária, as origens sociais dos gêneros literários, o social ligado aos temas e a base sociológica da evolução literária. Em suma, os estudiosos concentraram-se nos “macro” problemas de uma natureza teórico-cultural (influência das ideias marxistas). A tendência em considerar a sociologia literária como “disciplina guia” na literatura comparada persistiu até o começo dos anos 80. Desde aquele tempo, vários autores têm diagnosticado que a crítica literária está sofrendo de uma fadiga da sociologia. Segundo Peter Zima, nossa disciplina abandonou sua reivindicação teórica ao passar dos anos, enquanto que nos anos iniciais ela ainda tentava estabelecer conexões com o social e com as ciências naturais.
O apagamento do interesse não está desrelacionado com a evolução dentro de uma teoria cultural. Utilizando a crítica marxista, a sociologia literária pode descrever um fenômeno literário da perspectiva histórica da burguesia moderna. Teóricos como Lukács, Goldmann ou Adorno situaram a literatura contra a experiência do processo de modernização e seus portadores: os burgueses. O problema da modernidade tem se tornado cada vez mais complexo como os muitos debates sobre o pós-modernismo e pós-modernidade ilustram. O problema encontrado pela sociologia literária – e também por uma variedade de outras disciplinas afins – dá a impressão de que a modernidade tem se prendido em si mesma. A “Sociedade Burguesa” pode não estar muito distante para ser percebida como um conceito monolítico, que é uma das razões por que a sociologia literária marxista resistiu as crises. A inabilidade para estabelecer um discurso marxista adequado é indubitavelmente relacionado com a crise do conceito de “classes”, como Laclau e Chantal Mouffe tão convincentemente argumentam em Hegemony and Socialist Strategy..
Conceitos como “modernidade” e “sociedade burguesa” estão muitas vezes relacionados com a rudeza com a qual a sociologia tem sido aplicada em sociologia literária e no espaço teórico. Como Steven Best e Douglas Kellner explanam, o velho pensamento de esquerda “reduz a complexidade da realidade social ao debate sobre a produção e à luta classes, definindo uma multiplicidade de ‘posições subjetivas’ (classe, raça, sexo, nacionalidade) como posições de classe”. São precisamente essas posições subjetivas que têm funcionado como o ponto de partida da teoria cultural até recentemente (década de 80). A importância cultural na sua evolução teórica é o fato sociológico que os cidadãos urbanizados hoje, como o sociólogo alemão Ulrich Beck tem observado, vivem em uma sociedade individualizada. Eles se identificam cada vez menos com as instituições coletivizadoras hierárquicas e disciplinadoras do passado (religião, autoridade moral, partidos políticos, classes sócio-econômicas) e cada vez mais com os grupos que se autoregulam e estabelecem suas regras, freqüentemente relacionadas com a noção de subcultura.
Partindo das novas condições da subjetividade formuladas por Beck, alguém poderia facilmente argumentar que nenhuma distinção de classe tradicional (“a burguesia”) é capaz de funcionar como base ou descrição adequada das efetivas mudanças que afetam a sociedade moderna. Em outras palavras, nós estamos negociando como novos problemas que necessitam de novas estratégias sociológico-literárias.

- versão em português do original em inglês elaborada por OURIQUE, J. L. P. -


Considerando as reflexões presentes no texto acima, comente algumas possibilidades acerca dessas “novas estratégias sociológico-literárias” mencionadas. Nas suas leituras sobre o tema literatura e sociedade você identificou algum elemento crítico que pudesse sustentar consistentemente sua leitura de uma obra literária? Esse elemento está mais vinculado com a materialidade do texto ou com a cultura na qual essa produção está inserida? Como você percebe a relação litertura e sociedade – como um elemento complementar ou como algo fundamental para sua leitura? Cite ao menos uma leitura de um texto literário que vá ao encontro das suas respostas (pode ser tanto uma leitura própria quanto de um crítico especializado).